terça-feira, novembro 02, 2010

Sinceramente,

Eu não possuo a saudade; ela me possui.
Para isto, meus caros, o final do dia é um presente, uma dádiva, só para que se possa dizer "Ah, menos um!".
E dormir pela metade por reconhecer que, talvez, toda a realidade dentro de si seja uma farsa espreguiçando-se entre o capricho e a tolice.

A saudade é uma grande tolice.

E que não me venham os calmos dizer que é consequencia de viver. Que não me venham os comuns e controlados dizer que é a reação da ação. Não me venham, por favor, os caçadores de paciência discursar que é a prova de possuir algo real.

A saudade dói. É um vírus, uma moléstia, um imposto caro e injusto (mas que se continua pagando).
É como adoecer, como a injeção a tomar para depois expirar um alívio de que tudo vai ficar bem. É como engolir o remédio para dormir e rezar para o tempo se desintegrar do resto do universo e passar mais rápido - como querer distorcer todas as leis e criar um espaço egoísta e cego, longe de qualquer estado de consciência.

Tornamo-nos adictos e sedentários.

E quando a saudade se vai, o arrependimento inoportuno de tê-la amarrado nos pés e carregado consigo como um bêbado mancando.
E depois o alívio, o sorriso amortecido de volta, a leveza imprecisa do corpo, a anestesia da alma. Tudo soa como uma recompensa, uma indenização pelo plástico barato envolto nos pulmões, um pedido de desculpas envergonhado ao transtorno causado. Mas isso não é a saudade. É uma consequencia vil e mesquinha dela.

A saudade em si é uma grande tolice.

Um comentário:

Fernando César disse...

Tem uma coleção de livros [7 volumes] do Marcel Proust, escritor francês, maravilhosa! chama-se "Em busca do tempo perdido", creio que o nome já diz tudo... mas não quero comentar dessa obra, e sim uma frase que é como poesia [Bruno Tolentino(poeta) dizia que Poesia é uma maneira memorável de dizer, ou seja, algo pra se decorar mesmo, colocar no coração...]:

"O amor é o desejo de eternidade do ser amado" Sto. Tomás de Aquino

Saudade: frustração material por não poder ser eternizada...

[fazendo meus links com mais frases] essa agora do Louis Lavelle: "Toda duração é espiritual, e não material, pois a duração só conserva o que ela espiritualiza."

Saudade: uma tensão que nos coloca no abismo entre o tempo e eternidade, o mutável e o perene, o singular e o universal, o sentido e sua falta, ... , entre o amor e a indiferença.